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Franquia x Licenciamento de marca: riscos e cuidados na estruturação contratual

A distinção entre o Contrato de Franquia e o Contrato de Licenciamento de Marca é uma questão recorrente no universo empresarial, especialmente entre empresas que desejam expandir suas marcas por meio de terceiros. Embora, à primeira vista, esses dois modelos contratuais possam parecer semelhantes, eles envolvem estruturas jurídicas distintas, com objetivos, implicações e níveis de complexidade bastante diferentes. A compreensão precisa dessas diferenças é essencial para garantir a segurança jurídica da operação e a adequação do modelo à realidade do negócio.

O Contrato de Franquia é um instrumento complexo, cuja disciplina está prevista na Lei nº 13.966/2019, que dispõe sobre o sistema de franquia empresarial no Brasil. Essa legislação estabelece obrigações formais, como a exigência de entrega da Circular de Oferta de Franquia (COF), e determina as informações mínimas que devem ser prestadas ao potencial Franqueado. No entanto, mais do que um contrato disciplinado por uma lei específica, a franquia se caracteriza pela transmissão de um modelo de negócio estruturado e replicável. Nela, o Franqueador concede ao Franqueado, mediante remuneração, não apenas o direito de uso da marca, mas também o acesso ao know-how, suporte técnico, treinamentos, manuais operacionais e acompanhamento contínuo da operação. Trata-se de uma relação que pressupõe padronização, controle de qualidade e identidade entre as unidades da rede.

Já o Contrato de Licenciamento de marca tem natureza distinta. Ele é pautado pela autorização para uso da marca por um terceiro, nos termos da legislação de propriedade industrial, especialmente a Lei nº 9.279/1996 (Lei da Propriedade Industrial). O licenciado recebe apenas o direito de utilizar a marca em determinado produto ou serviço, em condições previamente acordadas, sem qualquer obrigação de adotar padrões operacionais, treinamento ou acompanhamento por parte do licenciador. Não há transferência de conhecimento técnico, tampouco suporte operacional. Em regra, a autonomia do licenciado é muito maior, e a relação jurídica mais simples e menos onerosa.

A adoção equivocada do modelo contratual pode acarretar riscos significativos. Empresas que operam com licenciamento, mas que na prática impõem treinamentos, fornecem manuais, realizam fiscalização de padrões e promovem acompanhamento contínuo, podem ver seus contratos requalificados como franquias. Nesse cenário, a ausência da COF, do cumprimento do prazo legal e das informações exigidas pela Lei nº 13.966/2019 pode resultar em nulidade contratual, responsabilização da empresa licenciadora e até mesmo reconhecimento de vínculo empregatício ou outras implicações legais.

É por isso que a escolha entre franquia e licenciamento deve ser técnica e fundamentada, considerando a estrutura do negócio, o grau de controle desejado pela marca e os objetivos comerciais da operação. A diferença entre os modelos não está apenas na nomenclatura contratual, mas sim no conteúdo da relação jurídica e na forma como ela se materializa na prática. Um Contrato de Licenciamento que reproduza a lógica e os instrumentos típicos da Franquia poderá ser desconsiderado como tal pelo Judiciário, com sérias consequências para a marca.

A atuação preventiva do departamento jurídico é essencial para orientar a escolha do modelo contratual adequado, redigir instrumentos coerentes com a realidade operacional e garantir a segurança jurídica de toda a cadeia de relacionamento. Seja pela complexidade e abrangência da Franquia, seja pela simplicidade e autonomia do licenciamento, a clareza na estruturação contratual é o primeiro passo para uma expansão saudável, sustentável e juridicamente segura.

Imagem: Envato



(*) Julia Quiroga Cotarelli.
Formada em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Advogada atuante na área de direito contratual com especialidade em Direito Desportivo.